Um dia feliz...
O
despertador antigo tocou aquele comum rimmmmmmmmmmmmm, e ela esticou o braço
apertando o botão de parar. Foi rápido ,pois já estava acordada há tempos,ou
melhor não dormiu devido a excitação.O ponteiro marcava 3 horas .Não precisaria
de mais que quinze minutos para estar pronta ,pois o primeiro ônibus começa a
circular a partir de 4 horas,mas a felicidade que sentia era maior que o medo e
ela não passa duas vezes no mesmo lugar ,então temos que estar despertos para
agarrá-la.
Seu momento havia chegado .
Vestiu a
melhor roupa: camisa de algodão xadrez azul e branco, calça comprida de brim, uma
imitação barata de jeans, sandália de couro cru, tipo nordestino e a bolsa
preta surrada. Verificou mais uma vez os
documentos ,olhou no espelho passando um pouco de sabonete no cabelo para
assentar alguns fios carapinha.
Fechou a
porta delicadamente e saiu para o amanhecer que ainda dormia. As ruas desertas
não amedrontavam.Porque quando vamos ao encontro do que queremos não vemos o
perigo a espreita,esqueceu até das palavras que sempre pronunciava antes de
sair: “Orai e Vigiai”.
Subiu a
escada escura e mal cheirosa da ruela até atingir a rua principal. Esperou
ansiosa o primeiro ônibus para levá-la até a Rodoviária.
Não queria
chegar atrasada e outro ônibus intermunicipal circulava com poucos horários. Mas
tudo daria certo .Estudou o percurso desde que chegara no seu pequeno quarto e
viu o telegrama para comparecer no endereço para tratar assunto de seu interesse.
Ela vibrou muito,
sabia que se tratava de um emprego o qual sonhara e se preparou durante anos
para essa oportunidade. Seu dia chegou.
Quando o
ônibus intermunicipal estava na estrada, denominada Rodovia da Morte, ficou em
pé para localizar o local que teria que descer. O motorista parou no quilometro
indicado e ela desceu.
Lá estava ela,
seu sonho, imponente, muitos prédios rodeado de um jardim enorme, tudo muito limpo.
Outro mundo ,ela pensou ,e eu quero muito pertencer a este lugar . Eu mereço.
Na portaria
suntuosa se identificou e não se importou com os olhares de desprezo das
recepcionistas quando disse a que veio.
Orientaram
como chegar ao prédio, dentre muitos, e mais uma recepcionista pediu para esperar,
até que o doutor a chamou.
Sentado em sua
mesa, foi muito objetivo, apontou uma lousa e já foi testando seu conhecimento
para o cargo.
Ela
respondia a tudo e escrevia com o giz rapidamente sem pestanejar em nenhum
momento.
Quando acabaram
as perguntas ele disse: eu prefiro um homem para esta vaga, e observando ela
dos pés a cabeça,continuou dizendo , acho que não terei nenhum problema com a senhora,
a vaga é sua “doutora”, mas vejo um problema que talvez você não queira aceitar.
Ela mais que depressa foi responder que aceitava qualquer exigência, ele cortou
sua palavra e disse que o salário seria de uma certa quantia que a deixou com a
cabeça fora de órbita. Era muito ,mas muito mais que ela almejou ganhar na vida
,talvez porque não se julgasse merecedora de tanto .
Despediu-se e agradeceu, querendo
se ajoelhar na frente daquele simpático senhor de olhos verdes. Ele se aproximou,
apertando forte sua mão dizendo: então até amanhã se você puder começar já
“doutora”. E ela humildemente respondeu:sim posso começar amanhã mesmo e
obrigado por me tratar de “doutora”.
E ele respondeu :somos iguais ,temos o
mesmo conhecimento e somos doutores.
Ela queria
só sair ràpidamente e chegar até sua mãezinha para contar tudo que aconteceu. Seu
sonho ,suas preces ,tudo compactuou para essa realização.
Quando saiu
da portaria sentiu que seus pés não tocavam no chão, parecia que voava e com um
sorriso nos lábios colocou os pés para atravessar a rodovia do outro lado onde
tomaria o ônibus de volta.
Ouviu um
barulho forte e estava voando novamente, é de felicidade pensou e sorriu.
Aquarela por Lucia Marina Rodrigues
Estava voando,
é a pressa de chegar e contar para mãezinha.
Sentiu seu corpo leve como uma
pena e seus enxergaram longe e viram :um corpo estirado na estrada ,viu uma
camisa de xadrez azul .
Que é isto?
Sou eu caída no chão?
Não pode ser!
Estou voando,
não sinto meus pés, mas é de felicidade.
E meu corpo não sinto!
Sou duas?
Quem está
com minha roupa caída no chão?
Porque não sinto meu corpo?
Ei, estou aqui!
Ninguém me vê?
Eu preciso contar para mãezinha que realizei o meu sonho!
Ei!
Para onde
estou indo!
Eu vou começar a trabalhar amanhã!
Ei me escutem!
Lúcia
Marina Rodrigues
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